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Nov18
[LIVROS] | Mrs Dalloway
Mrs Dalloway foi um dos livros que, mal terminei a sua leitura, senti que precisava de reler. Motivo: não gostei da tradução da edição que li, pelo que decidi aquirir depois a da Relógio D'Água e ler novamente, do zero. Passou tanto tempo entre uma leitura e outra, que acabei mesmo por lê-lo do zero, já que me lembrava de muito pouco do enredo. Curiosamente, à medida que o li tive uma sensação de familiaridade assombrosa.
Esta nova experiência de leitura foi, tal como esperava, muito melhor. Fiquei, mais uma vez, encantada com a escrita de Virginia Woolf (podem ler as opiniões de Orlando e Um Quarto Só Para Si), que acabei por não resistir a comprar os seus Diários, um calhamaço com cerca de 700 páginas que foi editado este ano, também pela Relógio D'Água, para ir lendo aos bocadinhos e saber mais sobre a vida desta mulher e autora incrível.
Mrs Dalloway é um daqueles clássicos que a maior parte dos leitores vai, em algum momento da sua vida, acrescentar à sua lista de "livros lidos", e que é muito famoso pelo domínio magistral da técnica do fluxo de consciência, através da qual conhecemos a mente de diversos personagens muito marcantes. Tudo isto num espaço de 24 horas, em Londres, onde damos pelo passar do tempo, sempre que o Big Ben toca. Percorremos ruas de Londres, vontades, dúvidas e medos dos personagens através de um fio condutor muito bem conseguido. Clarissa (Mrs Dalloway) sai de casa, para tratar dos preparativos finais da festa que vai dar nesse dia à noite, e todo um leque de personagens e acontecimentos se desenrolam perante os nossos olhos, de múltiplas perspectivas, de uma forma que muito me agrada em termos literários, apesar de não ser das mais consensuais entre os leitores.
Nunca mais diria de ninguém no mundo, agora, que esse alguém era isto ou aquilo. Sentia-se muito jovem e, ao mesmo tempo, indizivelmente velha. Passava como uma faca através de todas as coisas e, ao mesmo tempo, ficava de fora, a observar. Tinha a permanente sensação, quando olhava para os táxis, de estar de fora, de estar longe, sozinha, no mar; sempre havia tido a sensação de que era muito perigoso viver um só dia que fosse. Não que se julgasse inteligente, ou muito diferente dos demais. (...) Não sabia nada; nem línguas, nem história; raramente lia agora um livro, a não ser memórias, antes de adormecer. E, no entanto, era tão absorvente, para ela, tudo isto; os táxis que passavam. Mas jamais diria a respeito de Peter, jamais diria de si própria, eu sou isto ou sou aquilo.
Noventa e três anos nos separam da publicação de Mrs Dalloway, no entanto, os temas que Virginia Woolf aborda neste livro permanecem actuais e presentes nos nossos dias, tais como, a doença mental, o suicídio, a existencialidade, o feminismo. Das várias personagens deste livro, Clarissa Dalloway e Septimus Smith (um veterano da Primeira Guerra Mundial) foram as minhas preferidas, pois são aquelas cujas mentes são mais exploradas e que mais me fascinaram. Um livro incontornável da literatura que provavelmente vou reler novamente daqui a uns anos.